Até agora, nos posts sobre sono, já foram explicados o principal mecanismo de regulação do sistema sono-vigília (o ciclo circadiano) e os estágios do sono com suas principais características. Mas e os neurotransmissores, que são o tema principal do blog? Eles têm um papel fundamental no sono, porém até para entender esse papel, aquela introdução era necessária.
Diferentes áreas do cérebro agem para induzir ou inibir o sono. Elas são chamadas, por isso, de regiões agonistas e antagonistas do sono, respectivamente. Essa ação para modular o sono se dá por conexões dessas regiões outras regiões do cérebro, que têm sua atividade regulada, ou com o núcleo supraquiasmático, que é o “centro de controle” do sono, com seu controle do ciclo circadiano. Essas conexões são, geralmente, neurais, ou seja, há sinapses e neurotransmissores envolvidos. Durante o sono, a maior parte dos estímulos que chegam ao núcleo supraquiasmático vem das áreas agonistas do sono, enquanto na vigília, os estímulos vêm principalmente das áreas antagonistas do sono. Os neurotransmissores presentes nos estímulos que vêm das regiões agonistas do sono são considerados indutores do sono, ao passo que os neurotransmissores presentes nos estímulos provenientes das regiões antagonistas do sono são considerados inibidores do sono ou promotores da vigília.
Dois dos principais neurotransmissores envolvidos na inibição do sono são a serotonina e a noradrenalina. Esses neurotransmissores têm níveis elevados durante a vigília e níveis baixos durante o sono, sendo que os níveis mínimos ocorrem durante o sono REM. Há indícios de que eles sejam inibidores do sono REM. Os dois neurotransmissores, porém, estão relacionados a regiões antagonistas do sono diferentes, e há indícios de que a noradrenalina esteja relacionada à vigília com atenção a estímulos novos, inesperados, ao passo que a serotonina é associada a comportamentos automáticos. Além disso, a serotonina também é precursora da melatonina, um hormônio secretado pela hipófise com ação indutora do sono. Assim, apesar de estar diretamente relacionada à promoção da vigília e não do sono, há evidências de que baixos níveis de serotonina podem levar a distúrbios do sono, como insônia.
Histamina e hipocreatina são outros neurotransmissores relacionados à vigília. A histamina que promove a vigília no sistema nervoso central é o mesmo composto que é liberado pelo sistema imune quando há lesão de tecido ou reconhecimento de antígeno, causando edema e inflamação. É por isso que alguns medicamentos contra alergias que inibem receptores de histamina também causam sonolência.
A acetilcolina é o principal neurotransmissor indutor de sono REM. Os níveis de acetilcolina são altos na vigília e no sono REM e há indícios de que os principais acontecimentos do sono REM, como a dessincronização das ondas elétricas cerebrais, o movimento ocular rápido e a atonia muscular são promovidos por uma área do cérebro que utiliza acetilcolina.
Por fim, o GABA (ácido gama aminobutírico) é o principal neurotransmissor indutor do sono não REM. Como já foi visto no post específico sobre GABA, há três tipos de receptores para GABA, e a ativação de todos eles induz o sono não REM, especificamente os estágios 3 e 4, que são os mais profundos desse período. Diversos medicamentos contra a insônia e outros distúrbios do sono presentes no mercado se baseiam nessas propriedades do GABA, e muitos deles são suplementos contendo o neurotransmissor em si.
Bibliografia:
GOTTESMANN, Claude. GABA Mechanisms and Sleep. Neuroscience. Volume 111, No 2, pp 231-239, 2002
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